Internet: a moderna ferramenta para a prática do crime de auxílio ao suicídio

Direito

Análise dos riscos em potencial do mundo digital, buscando compreender a relação do Direito junto a esse modelo de sociedade e analisar quais as possíveis sanções a serem aplicadas aos crimes de auxílio ao suicídio praticados na internet.

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1. RESUMO

Atualmente são milhões de pessoas conectadas no mundo inteiro, na verdade em cada lugar que se olha é natural ver diversas pessoas com celulares, tablets, notebooks. A tecnologia ganhou espaço e seus seguidores atravessam fronteiras sem sequer sair do lugar. O presente trabalho visa abordar os avanços tecnológicos por meio da internet e analisar os riscos em potencial desse mundo digital desconhecido, uma vez que as mentes criminosas estão em todos os lugares, inclusive, nos espaços cibernéticos. Com isso, buscou-se compreender a relação do Direito junto a esse modelo de sociedade tecnológica e, por sua vez essa analisar quais as possíveis sanções a serem aplicadas aos crimes praticados tendo a internet como ferramenta principal. Além disso, intui-se as possíveis soluções que o Direito Penal pode aplicar neste cenário virtual. A pesquisa realizada ocorreu por meio de pesquisas doutrinárias somando o assunto abordado por diversos juristas, chegando-se a conclusão de que atualmente o Direito possuí mais atividade dentro do campo virtual do que se imagina.

Palavras-Chave: Internet. Crimes. Direito Penal.

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ABSTRACT

Nowadays millions of people are connected all over the world, in fact in every place you look it is natural to see several people with mobiles, tablets, notebooks. Technology has gained space and its followers cross borders without even leaving the place. The present work aims at addressing technological advances through the Internet and analyzing the potential risks of this unknown digital world, since criminal minds are everywhere, even in cyber spaces. With this, we sought to understand the relationship of law with this model of technological society and, in turn, to analyze what possible sanctions to apply to crimes practiced with the Internet as the main tool. In addition, it is possible to intuit the possible solutions that Criminal Law can apply in this virtual scenario. The research was carried out through doctrinal research adding the subject addressed by several jurists, arriving at the conclusion that currently the Law has more activity within the virtual field than one imagines.

Keywords: Internet. Crimes. Criminal Law.

2. INTRODUÇÃO

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O século XXI já pode ser chamado de século da tecnologia, do novo, do moderno, do inimaginável. A internet foi a maior forma de revolução tecnológica já inventada, na medida em que, atualmente, dificilmente alguém consiga se imaginar sem ela. Entre chamadas de vídeos, mensagens instantâneas e postagem de fotos, as pessoas tem se aproximado mais e mais da necessidade de estarem conectadas com o mundo virtual.

Mas será que já conhecemos o suficiente este novo modelo de comunicação social? Será que já estamos aptos a conviver com uma tecnologia sem precedentes? O fato é que a sociedade atual tem venerado uma tecnologia ainda desconhecida, estamos sempre com um pé no mundo real e o outro no virtual. Essa nova realidade mudou consideravelmente os nossos meios de relação pessoal. Não apenas isso, a internet aproximou pessoas, mas também aproximou relações jurídicas, comércios, publicidades, etc.

É inegável que a internet possui um papel fundamental em nossa sociedade, uma vez que auxilia na realização de estudos, trabalhos, pesquisas e até compras. O grande problema é que ao criar um novo modelo de sociedade a internet passou a gerar preocupações no âmbito jurídico, posto que a mente humana nem sempre gera boas finalidades. O homem enquanto ser social está voltado tanto para o bem como para o mal e, a internet acabou contribuindo como uma ferramenta moderna para a prática de crimes.

Com efeito, a legislação não hesitou, e o Direito não poderia manter-se afastado, uma vez que, mesmo na internet há bens jurídicos a serem tutelados. No presente caso, o crime deixou de ser apenas uma realidade do mundo real, passando a ser, também, realidade no mundo virtual. Por tais motivos, não poderia a internet ser considerada um espaço autônomo ao social, sendo possível e necessária legislação regulamentar sobre ela.

Ainda que muito se ouça falar na independência e desnecessidade de legislação sobre o ambiente virtual, em caso de crimes capazes de gerar danos a terceiros não pode o Estado manter-se inerte, já que cabe a ele o direito e dever de punir aquele que fira ou cause danos a bens jurídicos tutelados. Não poderia a internet ser esquecida, porquanto frequentada por pessoas, constituindo relações a cada click.

Ante os fatos, o Direito se fez essencial no ambiente virtual, a fim de proporcionar ordem e proteção aos chamados internautas. Não se pode olvidar, no entanto, que legislar sobre crimes na internet nunca fora, se quer de longe, tarefa fácil, isto porque o tema em questão gera diversos posicionamentos e, considerando que o Direito não é uma ciência exata, cada posicionamento pode contribuir para um desfecho de mudança a cada dia.

Este tema proporciona tantas divergências que houve até posicionamento de Tim Berners-Lee criador da internet. Segundo ele, legislação sobre a internet seria desnecessário, um vez que tira o aspecto de liberdade da rede e de seus usuários, de modo que deveria ser tratada, apenas como uma utilidade pública, não devendo ser importante para o que está sendo usada1. Em outras palavras, o pai da internet faz duras críticas sobre legislar sobre a internet, resta nítido que para ele a legislação sobre a Web é a prova de que o sistema esta falhando.

O ponto crucial da legislação na internet é justamente barrar liberdades capazes de gerar danos aos seus usuários, seja por meio de crimes contra a honra, fraudes, estelionatos, etc. É incontestável que a rede possui riscos, e expõe milhares de pessoas e informações, dessa forma, manter este ambiente desprotegido e longe do alcance do ordenamento jurídico seria o mesmo que permitir uma evolução totalmente anarquista.

Os crimes por meio da internet se tornaram reais e, a cada dia ganham mais força, sendo assim, um sistema de regulamentação e monitoramento deste ambiente, faz-se absolutamente necessário, na medida em que a sociedade não pode restar desprotegida e vulnerável frente aos perigos, ainda que virtuais.

Com efeito, o Direito não poderia ficar inerte, garantindo por meio de leis, os direitos dos internautas, bem como a responsabilidade das provedoras de internet, a fim de proporcionar a participação do Poder Judiciário no combate aos riscos e violações de direitos que possam vir a ocorrer neste mundo virtual. Dessa forma, temos que a presença do Direito dentro do sistema informático é essencial e de grande importância, uma vez que não é medida de justiça e, ainda fere a Constituição Federal de 1988, permitir que violações e ameaças a direitos sejam afastadas da apreciação do Poder Judiciário.

O tema é fonte de diversas discussões e pensamentos divergentes, isto porque a nossa sociedade tem se adaptado cada vez mais ao universo digital, na medida em que a comunicação pode ser estabelecida a qualquer momento e em qualquer lugar. Salienta-se que não se trata apenas de meras relações pessoais, pois cada vez mais o comércio também está presente nesse universo cibernético, o que pode gerar crimes de diversas naturezas. Sendo assim, manter o universo da internet longe da apreciação e regulação do direito, seria o mesmo que manter a sociedade vulnerável frente a criminalidade. Neste ponto, destaca-se que não cabe ao estado manter-se inerte frente aos danos que sejam causados aos sujeitos passivos no ambiente virtual, uma vez que a nossa legislação tem poder de posicionamento, cabendo, apenas um maior abrangimento desta área no universo jurídico.

3. DIREITO, SOCIEDADE E INTERNET

3.1. Breve analise da evolução histórica da internet

A rede mundial de computadores ou a internet, como é popularmente e mundialmente conhecida, se tornou um grande ícone dos meios de comunicações modernos, na medida em que revolucionou a forma de interação entre indivíduos de qualquer lugar do mundo através de sua tecnologia sem fronteiras. Historicamente, a internet efetivamente fora criada com um propósito evidentemente comunicativo, no entanto, jamais se esperava que se tornasse este divisor de águas para unificar sociedade, comunicação e tecnologia. Em outras palavras, podemos dizer que a internet, a partir de uma analise histórica, não fora criada com intuito de aproximar pessoas da tecnologia, mas sim para proporcionar comunicação diante de um iminente risco de ataques do período bélico.

Resumidamente, a internet foi criada em meados de 1960 e inicialmente mantinha um propósito diferente da finalidade da qual é utilizada hoje, na verdade foi criada com um propósito militar. Paul Baran com a intenção de se chegar a um meio de aperfeiçoar e manter a comunicação mesmo diante de um ataque inimigo criou uma rede sem comando um comando central, de modo que os pontos se equivaliam, garantindo, assim, que se um dos pontos de comunicação viessem a falhar, os outros continuariam funcionando normalmente, dessa forma, se teria uma via alternativa para manter uma comunicação estável. A Advanced Research Projects Agency (Arpa) fez a experiência de conectar computadores em todo o país intencionando uma forma de aprimorar a capacidade de uso e armazenagem (SILVA, 2003)2.

A ARPA teve sua formação no ano de 1958 pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos e possuía o intuito de criar recursos de pesquisas com o fim de aprimorar superiormente as tecnologias no âmbito militar em relação a União Soviética. Segundo Manuel Castells (2003, p.13)3 “A Arpanet não passava de um pequeno programa que surgiu de um dos departamentos da ARPA, o Information Processing Techniques Office (IPTO), fundado em 1962 com base numa unidade preexistente”.

O objetivo principal da Arpanet, por meio do (IPTO) era montar uma rede interativa de computadores, ou seja, seria o inicio de montagem e criação de um sistema militar de comunicações resistente a ponto de sobreviver a um ataque nuclear. Já no ano de 1990 a Arpanet teve cancelada sua operação, ocasião que libertou a internet de sua origem e propósito militar e a partir daí, diversos provedores de internet passaram a criar seus próprios meios de comunicação através de portas acessíveis à rede (Castells, 2003).

Após anos de continuas experiências, finalmente, em 1993 a internet foi utilizada comercialmente, advento que ocasionou a criação da WWW (World Wide Web). O WWW foi o salto que a internet necessitava para deixar de ser parte da absoleta arpanet e passar a ser uma experiência a ser vivida pelo mundo inteiro. A partir de então, o crescimento da internet nos trouxe até os dias atuais, ou seja, diante desse cenário tecnologicamente implacável e desconhecido por sua capacidade absoluta de superar qualquer outro meio de comunicação.

Atualmente a internet é formada por uma conjunção de mais de 40 mil redes no mundo inteiro, tendo como ponto incomum o Protocolo Transmission Control Protocol que possibilita a comunicação entre elas, tais protocolos funcionam como uma espécie de língua comum dos computadores que fazem parte essencialmente integrante da internet (SILVA, 2003). Após todos esses anos de aperfeiçoamento da internet, tem-se que hoje são milhões de pessoas conectadas no mundo inteiro, Assim, cumpre-se o que “profetizou” Bill Gates quando pronunciou que “não haverá vida fora da internet4”.

Nos dias atuais, a internet emplacou um papel fundamental para a sociedade, deixando de ser uma criação exclusiva e de uso restrito do passado para se tornar a maior fonte de informações, bem como a revolução tecnológica mais produtiva de todo o mundo, isto porque, a quantidade de usuários que acessam a rede todos os dias nos leva a um cenário quantitativamente ainda desconhecido, considerando que o seu crescimento não evidencia qualquer precedente. Cabe, ainda, pontuar que a internet está muito longe de ser uma tecnologia capaz de se tornar parte de um passado, considerando que sua importância para a sociedade a torna absolutamente fundamental.

Segundo Manuel Castells (2003, p.7):

Se a tecnologia da informação é hoje o que a eletricidade foi na Era Industrial, em nossa época a internet poderia ser equiparada tanto a uma rede elétrica quanto ao motor elétrico, em razão da sua capacidade de distribuir a força da informação por todo o domínio da atividade humana.

3.2. Direito e Sociedade

Desde os primórdios que o homem mantém a necessidade de estar em comunicação e em constante relação com outros, isto porque o homem pode ser considerado um ser social. Partindo desse principio, é notável que o homem em sua natureza é dependente de sociabilidade, de convívio e de relação interpessoal.

Segundo Betioli (1989, p.13)5 “onde quer que se observe o homem, seja qual for a época e por mais rude e selvagem que posa ser na sua origem, ele sempre é encontrado em estado de convivência com os outros”. Nesse sentido, tem-se que a relação social é uma das bases da formação humana, de modo que homem e sociedade são dependentes entre si, não sendo possível ao homem viver de forma isolada, da mesma forma que impossível seria falar em sociedade com apenas um indivíduo. Partindo dessa análise, nasce a sociedade para os homens como forma de construção de convívio e relação uns com os outros.

Sociedade pode ser definida como um agrupamento de pessoas que estão ligadas por meio de colaboração mútua, dividindo as mesmas preocupações, gostos e costumes. Uma vez formada a sociedade, a preocupação passa a ser a ordem, o respeito, a harmonia dentro desse convívio, uma vez que os homens são iguais em seus aspectos físicos e biológicos, mas diferentes em suas ações e pensamentos.

Dentro do cenário social, o Direito nasce com o propósito de equilibrar tal relação, dessa forma, o Direito agrega-se a sociedade como parte fundamental de proteção aos interesses sociais. De acordo com Betioli (1989, p.17) “O Direito, como instrumento de controle social, tem sua faixa e maneira própria de operar, manifestando-se como um corolário inafastável da sociedade”.

Em outras palavras, pode-se considerar o Direito como uma ferramenta de controle social, no entanto, é importante ressaltar a ideia de que apesar do Direito fazer parte dos meios de manter a ordem e a harmonia entre os homens, ele não é o único meio adotado para tanto, fazendo-se necessário mencionar a religião, a moral e as regras de trato social que claramente contribuem também para o sucesso das relações sociais, no entanto, o Direito pode não ser o único pilar para manter a ordem social, mas pode ser considerado a garantia da reciprocidade nas relações sociais (BETIOLI, 1989).

Assim como a sociedade depende dos homens para se constituir, é possível dizer que sem o Direito seria impossível a vida em sociedade, da mesma forma que sem a sociedade o Direito por si só não existiria, dessa forma, conclui-se que existe uma evidente dependência entre sociedade e Direito.

Em suma, o Direito busca acompanhar a sociedade a fim de criar soluções para os conflitos que acompanham a complexidade das relações humanas, nesse ponto, inexistindo qualquer meio de relação social a eficácia do Direito restaria morta. Em contra partida, uma sociedade não acompanhada por um controle maior, restaria extinta pela própria natureza humana, portanto, “nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção. A vida em comum, sem uma delimitação precisa da esfera de atuação de cada indivíduo, de modo que a liberdade de um vá até onde começa o direito do outro” (BETIOLI, 1989).

Tal organização teoricamente parece funcionar de forma maestral, mas é quase inconcebível que homens se organizem dessa forma sem chegarem a diversos conflitos entre si, exatamente por isso que Thomas Hobbes mencionou ser o homem lobo de si mesmo6, uma vez que estando o homem em conflito constante consigo mesmo, como poderia organizar-se com outros sem gerar atritos de ordem social. Diga-se, então, que as relações sociais jamais se dariam sem regras ou normas de conduta social, por tal motivo o Direito cria-se na sociedade e a partir da sociedade.

O homem por si só tem em sua natureza a liberdade, o livre-arbítrio, isso faz com que mergulhe na ideia do “querer é poder” de modo a esquecer da delimitação entre suas intenções e o direito do próximo. Tais ideias direcionam o homem ao senso comum de estar sobre e acima de tudo ao seu redor, isto porque conhece sua capacidade superior por meio do intelecto. As relações sociais correm riscos exatamente quando entram em contato com tal ideia, pois gera conflitos de interesses, uma vez que cada indivíduo tende a se sobrepor ao interesse do próximo, nutrindo uma falsa percepção de liberdade.

Por tal premissa os homens em sociedade estão condicionados, não a ponto de viverem sob regras pessoais, pois para tal considera-se a moral e sua própria consciência, porém vivem condicionados sob regras de convívio social geradas pelo Direito a partir da necessidade de organização. Se a liberdade criada pelo intelecto humano, tende a criar conflitos de natureza social, uma organização voluntária e espontânea fugiria a própria natureza humana.

Por essas razões há reciprocidade de dependência entre o homem e a sociedade, e a sociedade com o Direito. Daí porque “homem, sociedade e Direito estão intimamente ligados” (BETIOLI, 1989, p. 19).

Se como visto, existe a dependência de um pilar para a organização social de convívio entre os homens e tal dependência está condicionada a regras que se impõe como melhor maneira para uma convivência pacifica e ordenada, podemos concluir que o Direito constitui-se como o meio ideal de ordenação das relações sociais.

No entanto, faz-se necessário mencionar que o Direito apesar de basilar das relações sociais, não impede a existência de conflitos, na verdade, o Direito pode ser considerado ferramenta de controle social justamente porque prevê solução para o conflito que eventualmente virá a existir. A partir dessa análise, o Direito não possui o condão de impedir conflitos e sim de solucionar os que se formarem entre partes ou coletivamente.

Dentre os diversos conceitos que se tem, o Direito pode ser visto como aquilo que é reto, que direciona, que impõe um dever de fazer ou não fazer. Ainda que se tente fugir de especulações ou que ainda não se tenha chegado a uma definição precisa do Direito, uma coisa não pode ser negada e deve ser levada em consideração: o Direito tem como base de sua formação a coercibilidade, pois apesar de se impor como ferramenta que prevê soluções a controvérsias que podem surgir, ele impõe, também, sanções para quando estas controvérsias se tornarem realidade no caso concreto.

Por estes motivos, conclui-se que não pode haver sociedade sem direito, isto porque, “o fato inegável é que as relações entre os homens não se dão sem o concomitante aparecimento de normas de organização da conduta social” (BETIOLI, 1989, p. 19).

Dessa forma, se buscamos uma convivência ordenada, o Direito corresponde essa expectativa como controle social que corresponde a essa exigência da sociedade.

3.3. Sociedade da informação

Como visto anteriormente, a sociedade compõe-se de relação social, interação e comunicação constante entre pessoas. Nos importa destacar que assim como o homem muda, a sociedade se amolda de acordo com as mudanças trazidas por ele.

De acordo com o filósofo pré-socrático Heráclito de Éfeso7 nós não podemos jamais adentrar nas mesmas águas de um rio, pois assim como as águas, nós mesmos também já somos outros. Em outras palavras é impossível que algo se mantenha inerte com o passar dos anos, isto porque as mudanças são inerentes à vida.

Tal fenômeno aplica-se a sociedade, que com o passar dos anos deixa de ser a mesma, tornando-se outra, assim como nós mesmo deixamos de ser o que fomos no passado, seja no aspecto intelectual, no aspecto físico e até mesmo nas relações com outras pessoas. De acordo com Damásio de Jesus e José Antônio Milagre (2016, p.17)8 “é preciso que se diga que a sociedade não é uma pedra, estática, mas um organismo de mudanças, em constante transformação”.

Se tais mudanças tendem a ser aplicadas à sociedade e ao homem, uma delas, se não a maior, foi a internet, que trouxe consigo uma tecnologia revolucionária e com uma dimensão sem precedentes, das quais nem o próprio homem possui total conhecimento. Segundo Eric Schimidt (2013 apud JESUS, 2016, p.17), “a internet é a primeira coisa que a humanidade criou e não entende, a maior experiência de anarquia que jamais tivemos”. Veja-se que até os dias atuais, em pleno século XXI, a internet ainda é um campo desconhecido, um mundo paralelo á realidade humana.

Segundo Patrícia Peck Pinheiro (2007, p.16)9:

A internet veio possibilitar não apenas o encurtamento das distancias com maior eficiência de custos, mas, sobretudo, a multicomunicação, ou seja, transmissão de texto, voz e imagem. A multicomunicação, associada à capacidade de respostas cada vez mais ágeis, permite que a internet se torne o mais novo veículo de comunicação a desafiar o modo como nos relacionamos.

Olhando ao passado, não há qualquer ser humano que pudesse imaginar um avanço tão devastador nos meios de comunicação, levando-se em consideração que tais meios se davam por pergaminhos, cartas, etc. Para conseguir comunicação com outro individuo era necessário viagens de semanas, meses e até mesmo anos. Hoje o cenário não é outro, se não diversas e diversas pessoas trocando mensagens instantâneas por meio de smartphones em qualquer lugar em que estiver. A internet, inegavelmente trouxe uma revolucionária forma de interação entre pessoas do mundo inteiro. É possível se comunicar instantaneamente com pessoas que estejam até mesmo em outro país, o que no passado, nem sequer poderia ser imaginado.

É partir do advento da internet que nasce uma nova forma de sociedade, uma sociedade da informação, do “conhecimento é poder”. Tal sociedade pode ser conceituada como a sociedade universalizada, globalizada e totalmente voltada à informação. Seria o mesmo que dizer que qualquer indivíduo ligado à internet está incluso neste novo modelo de sociedade.

A sociedade da informação nasce a partir do alto crescimento das tecnologias, dos meios de comunicação, do conhecimento por meio de milhões de informações que jorram a todo o tempo na rede. Segundo Tom Chatfield (2012, p.13)10 estamos “vivendo em uma nuvem de dados: redes inteligentes estão começando não apenas nos conectar uns aos outros, mas a tudo, de carros a roupas”.

Nos dias atuais as pessoas podem realizar qualquer tipo de trabalhos ou até mesmo realizar compras sem sequer sair de casa, tudo isso por meio da internet. Essas mudanças crescem de forma acelerada a ponto de causar preocupações, afinal não se tem uma previsão de crescimento da internet. Neste ponto “os fatos impossíveis de nosso tempo estão apenas começando” (CHATFIELD, 2012).

Por mais que tentamos conhecer a internet e suas tecnologias, a cada dia nos impressionamos mais com suas alterações, considerando que o ritmo com que essas mudanças ocorrem é completamente sem precedentes, dessa forma a análise que se faz superficialmente é de que estar conectado passou a ser uma realidade e mais do que isso, passou a ser uma necessidade para as pessoas. Isso se dá exatamente pelo fato de que a maior fonte de informação é a internet, dessa forma, estar conectado é estar informado.

Para Damásio de Jesus (2016, p.17) “Nas escolas, no trabalho, ou nas relações pessoais, estar online é realidade, não no mero contexto de estar conectado, mas no sentido de estar incluído digitalmente, algo além do tradicional ler e escrever, diga-se, ser um ser social digital, estar “em rede””. Em outras palavras, estar fora da “rede” ou não fazer parte do espaço “cibernético” é estar desconectado do mundo.

A existência dessa nova sociedade já é uma realidade, vivemos por ela e a partir dela em todas as tarefas que aplicamos no nosso dia a dia, seja para realizar um pagamento, ou uma transação bancária ou até mesmo realizar uma rápida pesquisa. “Vivemos em uma sociedade em que nos comunicamos muito, sem saber como tal comunicação é possível, como, quando e por onde. A dominação informacional é flagrante, embora nem todos reconheçam. E informação é poder” (JESUS, 2016).

Se estar conectado é uma realidade e se a sociedade da informação é o nosso atual modelo, então, nos cabe buscar entender os pontos positivos e negativos desse novo modelo de comunicação social. É um fato inegável que a internet contribui consideravelmente para a busca de informações e conhecimentos, além de possibilitar a aproximação de costumes, diferentes culturas e até mesmo de pessoas.

No que se refere ao conhecimento sem fim, a internet é o pote de ouro atrás de um monitor, isto porque dispara milhões de informações seja sobre o que ou quem se queira saber. Ademais, a vida acadêmica e profissional foi facilitada de modo assustador e tal aspecto pode ser considerado como o principal ponto positivo na inserção da sociedade da informação. No entanto, ainda que muitas sejam as pessoas conectadas ao redor do mundo, ainda há pessoas que desconhecem completamente este mundo cibernético acarretando em si o primeiro ponto negativo desse novo modelo social.

Atualmente, é possível dizer que um indivíduo que esteja fora de “conexão” ou fora da “rede” está completamente fora da realidade social, de modo que não possuir acesso à internet é o mesmo que ferir direitos de um cidadão, tanto que o Direito já busca meios de inclusão digital, garantindo este alcance por meio de leis. Segundo Damásio de Jesus (2016,17) “é inerente a esta sociedade que o aceso livre às tecnologias e à rede seja um direito de todos os cidadãos. Mais do que isso, garantias e liberdade constitucionais passam a ser consideradas e refletidas à luz dos impactos que as novas tecnologias trazem no dia a dia”. Neste aspecto, um cidadão sem acesso a internet é um cidadão privado de um direito de conhecimento e informação.

A inclusão digital de pessoas é algo a ser aproximado da realidade, pois nota-se que a sociedade da informação possui um viés discriminatório se manter apenas parte da sociedade conectada, sendo assim, é possível dizer que se o novo século veio demonstrar um novo meio de condução tecnológica para a humanidade, também pode causar um enorme distanciamento se não houver a permissão de outras milhares de pessoas em mesma condição de igualdade a esse novo mundo virtual (VALLE, 2005)11. Assim, é imprescindível que a inclusão digital não só alcance as diversas pessoas que desconhecem essa nova sociedade, mas que também permita uma forma igualitária de acesso à internet e ao mundo virtual.

Além disso, há que se atentar ao fato de que conhecemos superficialmente o alcance tecnológico da internet e, enquanto o incentivo a busca pelo conhecimento torna-se um fragmento estrutural de absoluta importância para a atual sociedade, por outro lado, é importante se perguntar até onde esta busca pelo conhecimento é construtiva, afinal, com os novos meios de comunicação social o contato pessoal entre indivíduos tem se tornado cada vez menor, de modo que manter uma busca incessante pela informação permanecendo-se constantemente conectados, causa um impacto temerário, uma vez que o espaço virtual não busca construir conhecimento dentro de si mesmo e para si mesmo. Dessa forma é importante que indivíduos conectados tenham a consciência de que existem grandes diferenças entre os dois mundos paralelos, devendo haver equilíbrio entre a percepção da realidade e do virtualismo, porquanto em nada resultaria obter um turbilhão de conhecimento se não para dividi-los com outras pessoas.

É exatamente neste aspecto que se fixa o segundo ponto negativo da sociedade da informação, pois percebe-se que o crescimento sem precedentes da internet, tende a afastar, cada dia mais, as pessoas de sua realidade. Isso decorre do crescimento de usuários conectados gradativamente. Segundo Tom Chatfield (2012, p.12)12 “em apenas duas décadas, no entanto, fomos da abertura da internet para o público geral à marca de mais de 2 bilhões de pessoas conectadas; e passaram-se apenas três décadas desde o lançamento do primeiro sistema comercial de celular até a conexão de mais de 5 bilhões de usuários ativos”. É notavelmente uma indústria com estimável número de crescimento, cuja quantidade de usuário tende a crescer efetivamente mais.

É necessário que haja uma particular atenção à forma como as relações sociais tem crescido através do meio virtual, uma vez que “todas as tecnologias afetam nosso comportamento à medida que as utilizamos: “moldamos nossas ferramentas, e então as ferramentas nos moldam” (CHATFIELD, 2012). Em suma, aproximar-se das tecnologias pode afastar o individuo de sua própria realidade, a ponto de afasta-lo da sociedade real e aproxima-lo de uma sociedade virtual. Entre o conhecimento, a informação e a realidade, cabe atenção, a fim de não permitir que nossas verdadeiras relações pessoais se percam.

Dessa forma, podemos concluir que a sociedade da informação é bem vista no aspecto reprodutor de informações e conhecimento, no entanto, quando trata-se de seus impactos negativos, ainda é um campo desconhecido, pois não sabemos e ainda estamos muito longe de saber qual será o resultado desse novo modelo de sociedade daqui a vinte ou trinta anos. Por tais motivos, devemos receber as tecnologias e abraça-las na medida em que nos permite facilidade e ausência de privação. É fundamental conhecer a tecnologia, porém jamais ser dominado por ela.

4. A INCITAÇÃO AO SUICÍDIO POR MEIO DA INTERNET

4.1. Dos riscos e dos crimes nas relações virtuais

A mente humana é uma das coisas mais incríveis a ser estudada, isto porque recebe milhões de informações e conhecimento criando, consequentemente, resultados como reflexos daquilo que absorve. A criatividade da mente humana alcança um patamar tão complexo que até os dias de hoje é matéria de estudos psicológicos. O problema é que naturalmente, a mente humana também desenvolveu a capacidade de “criativizar” o mal e atrelando-se a internet, recaímos sobre o temor de criminosos quase que invisíveis.

Segundo Damásio de Jesus (2016, p.17) “a internet é rica, e onde há riqueza, existe crime”. Apesar dos inúmeros benefícios proporcionados pela internet, ela também pode ser usada como uma ferramenta propicia a estimular a pratica de crimes, isso porque garante um determinado anonimato que reproduz uma sensação de impunidade ao criminoso.

“E com o avanço da tecnologia, limites desaparecem, nada mais parecendo ser impossível, como também, menos verdade não é, o ser humano disso se aproveitou para continuar praticando aquilo que parece ser endêmico à própria raça: crime” (INELLAS, 2004)13.

É notório que a sociedade da informação também atribui riscos, pois pode facilmente ser utilizada para prática de crimes, de modo que a vulnerabilidade das vítimas é consideravelmente maior em decorrência da ausência de informação e instruções nesse sentido. Nota-se que não há nenhum tipo de estimulo à educação digital, dessa forma, os indivíduos levados à tecnologia por força da atualidade podem ser considerados pressas fáceis para os criminosos virtuais. Conforme visto anteriormente, conhecimento é poder, e no mundo virtual quanto maior o conhecimento de um indivíduo sobre o espaço cibernético, maior poder ele tem sobre os outros “e o grande problema é o uso deste poder para más finalidades, sobretudo em um país onde a educação digital (que não se confunde com aulas de informática) passa longe das escolas” (JESUS, 2016, p. 19)14.

A internet pode ser usada para diversos benefícios, no entanto também pode ser usada como um território atraente para criminosos, isto porque atribui uma espécie de conhecimento minucioso sobre seu funcionamento, “a internet é vista, por muitos, como um caos organizado ou um caos que funciona. Tudo pode se ligar a tudo, com um clicar do mouse” (COSTA, 1998, p. XVII)15. Esse espaço atrai mentes criminosas, justamente pela sua facilidade de funcionamento e alcance de indivíduos do mundo inteiro em apenas um click.

Será que realmente você conhece todos os amigos inseridos em sua página nas redes sócias? Será que pode confiar? Será que todos eles fazem parte de sua vida, de seu convívio ou de seu ciclo social? É uma prática muito comum aceitar “estranhos amigos” nas redes sociais ou conversar com eles por meio de chats e bate papos, o grande problema é que não se sabe quem é a outra pessoa por trás da tela do computador e, por mais que poucas pessoas pensem a respeito, a intenção humana não é algo que se demonstra junto com a sua apresentação, tampouco se caracteriza com meras alegações.

Atualmente tudo pode ser motivo de alerta, seja sites de anúncios até as redes sociais, ainda mais se levarmos em consideração quem nem todos os “amigos virtuais” são de fato pessoa de nosso convívio ou em quem podemos confiar. A fantasia faz morada perpétua na internet, exatamente pelo fato de que neste espaço virtual as pessoas podem facilmente ser quem dizem e não quem realmente são, e o ponto de risco é não possuir mecanismos de confronto entre um perfil verdadeiro e outro falso, restando para os internautas a incerteza e o benefício da dúvida, porém tal benefício, muitas vezes, pode custar o patrimônio, a honra, a imagem e até mesmo a vida de um indivíduo.

São inúmeros os crimes que podem ser praticados por meio da internet, pois o criminoso possui variedades de vítimas, de espaços e de mecanismos. Segundo Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2004, p.10)16 “as infrações penais são as mais variadas, como o são, de igual modo, suas vítimas”. A atualidade enseja preocupação, não só no nosso espaço físico, mas também no novo espaço da qual passamos horas e horas, ou seja, o espaço virtual. Os crimes variam podendo ir de fraudes, configurando estelionato e crimes contra o patrimônio, pornografia infantil, crimes contra a honra, falsidade ideológica e diversos outros.

O maior obstáculo é que apesar da internet fornecer milhões de informações, ela também garante o anonimato, gerando um verdadeiro paradoxo, porém sendo fato de que por este motivo ela é o primeiro lugar escolhido pelos criminosos.

De outra sorte, é preocupante ver a internet ganhando visibilidade e sendo menção em meio de telecomunicações jornalísticas por sua potencial característica de espaço para a prática de crimes, uma vez que o que antes era apenas uma conjectura da mente criminosa se tornou uma realidade que causa alerta a sociedade. Nesse aspecto, estar conectado é manter-se informado, porém é manter-se, também, sob os riscos iminentes do ciberespaço17.

O índice de crimes praticados por meio da internet vem crescendo a cada dia e como mencionado anteriormente, o que mais contribui para este fato é ausência de conhecimento das pessoas sobre o âmbito digital. Segundo o dicionário, vulnerável é aquele que se encontra em estado de fragilidade, exposto, indefeso18, é assim que se conceitua um individuo privado do conhecimento digital, pois é persuadido muito facilmente por aqueles que possuem uma mente alienada ao mal em conjunto com um maior conhecimento digital.

É fato, e dele não podemos esquivar-se: a internet se tornou a ferramenta moderna para aqueles que pretendem cometer ilícitos penais, tanto o é que a legislação voltou-se a buscar uma aproximação do Direito, a fim de coibir e mitigar aquilo que crime for. O que não se pode esquecer é que a internet pode ser um ambiente buscado para boas e más finalidades, uma vez que é frequentada por diversas pessoas no mundo inteiro e que para muitos ainda é considerado um espaço sem dono e sem leis, tornando a prática de crimes mais viável e tendente ao acrescimento.

4.2. Os crimes comuns na internet e a aplicação do Código Penal

A liberdade da internet não pode se considerada um meio de impunidade para a prática de crimes, uma vez que “o fato de esses crimes estarem acontecendo na internet, não é óbice à punição pelo direito positivo” (INELLAS, 2004, p. 10).

A constituição em seu artigo 5º, XXXV, prevê que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, sendo assim, manter os crimes praticados por meio da internet, afastados do conhecimento do Poder Judiciário, seria o mesmo que deixar o estado de praticar o “Jus Puniendi”19 restando-se em ausência de punição para aqueles que cometem crimes por meio da internet.

O Direito Penal, assim como os outros diversos ramos do Direito, deve estar próximo do espaço virtual, porquanto trata-se de relações entre indivíduos, não podendo ficar a mercê da vontade de cada um, nota-se que se o Direito é a base da sociedade, afasta-lo do espaço virtual seria o mesmo que permitir uma sociedade reger-se por suas próprias regras, mas o fato é que a muito tempo restou evidente que o homem necessita do Direito como controle social, sendo assim, no espaço virtual não poderia ser diferente.

Há muito se ouve dizer que “a internet não tem dono”, ora, mais tal afirmação não pode ser usada como elemento justificativo para ausência de legislação sobre os fatos descritos como crime em lei, cometidos no espaço virtual. Referido termo não pode ser interpretado de forma a afastar a lei.

De outra banda, muito já se cogitou a hipótese de desnecessidade de legislação sobre o ambiente virtual, mas se assim o fosse, a vulnerabilidade dos indivíduos no espaço virtual se tornaria vasta e até ensejaria a liberdade de cometer novos ilícitos na rede. “Constatam-se nas ações ilícitas uma verdadeira ameaça à paz social na medida em que aumentam as práticas ilícitas com o uso do computador” (SILVA, 2003, p. 50)20. Se existe lesão ou ameaça a direito, não há que se falar em desnecessidade de legislação.

A maior fonte de crítica é a desatualização do Direito Penal sobre os crimes praticados pela internet, levando a acreditar-se em um novo ramo do Direito, um ramo autônomo de forma a elencar um rol especifico de tipificação para essa espécie de crime. Segundo Rita de Cássia Lopes da Silva (2003, p.50) “o Direito Penal, diante da nova realidade trazida pela informática, não pode continuar alheio às transformações, mas isto não significa reconhecer o surgimento de um novo ramo autônomo do Direito”.

Deve-se confrontar a realidade quando se busca a necessidade de um novo ramo do Direito, isto porque muito do que já se tem é estendido àquilo que se busca e este é o caso do Direito Penal. A princípio é importante destacar que não se discute aqui a prática dos crimes propriamente informáticos, pois para estes a necessidade de legislação específica salta aos olhos, o que se busca é a análise dos crimes comuns praticados por meio da internet.

Muito se sabe que o nosso Código Penal fora elaborado no ano de 1940, carecendo de diversas atualizações que se posterga com o passar dos anos, na medida em que a sociedade jamais será estrategicamente mantida em estado de inércia. Neste contexto a maior dúvida é o cabimento de aplicação do Código Penal aos crimes praticados pela internet, de acordo com Rita de Cássia Lopes da Silva (2003, p.50):

O que se vive, hoje, é a realidade de inúmeras ações serem praticadas com o uso do computador e a indagação no sentido de se saber se essas ações, prejudiciais ao convívio social, encontram ou não correspondência típica em nossa legislação penal.

Veja-se que esse sempre foi o ponto de discussões quando se trata de crimes praticados por meio da internet, uma vez que se busca evitar a impunidade para esses atos criminosos. No entanto, nos dias atuais, resta mais que evidente a adequação do nosso Código Penal aos crimes comuns praticados por meio da internet, se não vejamos.

Considerando os conceitos doutrinários, veremos que o objetivo do Direito Penal é a prevenção da integridade social em todos os seus aspectos, atribuindo sanção ao indivíduo que fira qualquer uma dessas integridades. Segundo Fernando Capez (2014, p.17)21 “a missão do Direito Penal é proteger os valores fundamentais para a subsistência do corpo social, tais como a vida, a saúde, a liberdade, a propriedade, etc., denominados bens jurídicos”.

Com efeito, a incidência do Código Penal garante amparo aos indivíduos de uma sociedade, garantindo-lhes a proteção de sua integridade física, psíquica, material e até mesmo intelectual. Partindo deste princípio, é possível caracterizar o primeiro elemento capaz de rechaçar a inaplicabilidade do Código Penal aos crimes praticados no campo virtual, isto porque, até mesmo os internautas, como indivíduos que são, estão amparados pela proteção advinda deste ramo do Direito.

Lembrando-se que o Direito Penal possui duas vertentes, quer seja, proteção e punição e estando a sua proteção voltada aos usuários da internet, a sua segunda vertente, por sua vez, evidentemente volta-se ao criminoso virtual, pois se há crime, então há homem, uma vez que a tecnologia é apenas um meio a facilitar a execução da conduta criminosa. Atente-se ao fato de que o Direito Penal está limitado à conduta humana, pois seu objeto nada mais seria do que o próprio ser humano. “O Direito Penal somente pode dirigir os seus comandos legais, mandando ou proibindo que se faça algo, ao homem, pois somente este é capaz de executar ações com consciência do fim” (CAPEZ, 2014, p. 20). Sendo assim, adequa-se como objeto do Direito Penal o criminoso virtual, que nada mais é do que um indivíduo aproveitando-se da tecnologia para a prática de crimes, cabendo-lhe inequivocamente a aplicação do Código Penal.

Fazendo uma breve análise do conceito de crime e sua adequação ao Código Penal, veremos que segundo os conceitos doutrinários crime é todo fato típico, ilícito e culpável, em outras palavras o crime se constitui a partir da adequação entre a conduta e o fato tipificado como crime.

Por sua vez, o fato típico possui como principais elementos a conduta, o resultado, o nexo causal e a tipicidade. Reunidos tais elementos configura-se a materialidade do crime. Por tais elementos, o fato típico, nada mais é do que a adequação entre a conduta realizada pelo agente ao fato tipificado na lei como crime. Nas palavras de Fernando Capez (2016, p.132) fato típico “é o fato material que se amolda perfeitamente aos elementos constantes do modelo previsto na lei penal”. Em suma, reunidos todos esses elementos, constitui-se a figura do crime que, por sua vez, tem sua punição especificada e aplicada por meio do Código Penal.

A partir desse breve resumo, podemos concluir que se a conduta praticada pelo criminoso virtual for aquela tipificada no nosso Código Penal como crime, então não há justa causa para a criação de um novo ramo do Direito para puni-los, isto porque resta evidente que só o fato da conduta ser realizada por meio da internet não modifica o conteúdo ou altera o tipo previsto na legislação penal.

A prática do crime comum por meio da internet, não obsta a aplicação da lei penal, considerando que o computador é apenas uma ferramenta, mas a conduta continua sendo a mesma. Assim como o assaltante usa uma arma para a prática do crime de roubo ou o estelionatário usa documentos falsos para alcançar a vantagem ilícita em prejuízo alheio, o criminoso virtual se utiliza do computador para realizar a prática criminosa e, se em nenhum desses casos anteriormente citados o Código Penal é afastado, porque para o crime praticado por meio da internet seria?

O Código Penal é aplicável, desde que as condutas se amoldem aos seus tipos penais, o que é o caso dos crimes comuns praticados pela internet. Nas palavras de Regina Ribeiro do Valle (2005, p.165)22 “não vinga como absoluto o conceito segundo o qual a impunidade, no caso da internet, tem na existência de leis a sua única ou maior causa. A rede mundial de computadores, no Brasil, é bem amparada pela legislação penal”.

Além disso, é válido que se destaque que apesar da internet ser uma tecnologia recente e os crimes praticados por intermédio dela seja uma nova espécie de “modus operandi”23, não há confronto com o principio da anterioridade da lei, na medida em que o instrumento é novo, porém a conduta antiga e já prevista na lei penal. Por tais motivos, rechaça-se a ideia de um novo ramo do Direito, pois a lei existe, as condutas estão tipificadas e a internet, por si só não possui o condão justificável para alteração da lei penal.

4.3. Do Direito á vida

O direito á vida pode ser considerado o direito mais sagrado e protegido e não só pela legislação brasileira, na medida em que é citado no capítulo II, art.4 da Convenção Americana de Direitos Humanos. Segundo o item.1 da referida Convenção: “toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”24.

Além disso, o direito a vida também é consagrado no Pacto internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas de 196825, onde estabelece, em seu artigo 6, item 1, que o direito a vida é inerente a pessoa humana, devendo ser protegido pela lei, de modo que ninguém poderá ser privado arbitrariamente de sua vida.

Em nossa legislação, o direito a vida está previsto no título II, art.5º, caput, da Constituição Federal de 1988 como um direito fundamental, e possui duas vertentes sendo que garante o direito de estar vivo ou de não ser morto como, também, o direito de ter uma vida digna. A partir dessas vertentes, e limitando-se a primeira delas, é que nasce a vedação á pena de morte, salvo em circunstancia de guerra declarada e, ainda assim a legislação limita o poder constituinte a possibilidade de emendas que reabilite a referida pena ou outros direitos fundamentais já garantidos, por meio da vedação ao retrocesso26 ou o chamado “efeito cliquet”27, previsto no art.60, §4º, inciso IV (LENZA, 2013, p. 1040)28. Ora, se o direito a vida abrange garantir ao homem o direito de estar vivo, e é considerado um direito fundamental previsto em nossa legislação, não seria razoável ao estado manter como lícita a pena de morte.

Além disso, o direito a vida também está amparado pelo nosso Código Penal, em seu artigo 121 que tipifica o crime de homicídio, ou seja, matar alguém, pois sendo este direito protegido pela nossa lei maior (Constituição), não é dado a nenhum indivíduo, o direito de tirar a vida de outro, sendo punido pelo estado aquele que praticar tal conduta.

A partir dessa análise, é possível compreender a amplitude do direito a vida. Tal direito, se sobrepõe a qualquer outro e não há sobre ele disponibilidade. Em outras palavras, ninguém pode dispor de sua vida ou dela abrir mão, ainda que em favor de outrem.

Conclui-se, ainda, que o direito a vida é o primogênito dos direitos, pois sem vida não haveria necessidade de qualquer outro direito, porquanto seriam absolutamente dispensáveis, uma vez que não seria possível aplica-los se não houvesse qualquer sinal de existência humana. “A existência humana é o pressuposto elementar de todos os demais direitos e liberdades dispostos na Constituição” (MENDES, 2017)29.

Por tal motivo, o direito a vida é considerado o direito precedente a todos os outros. Qualquer que seja o direito, sem a vida humana, ele seria prescindível, já que aquilo que não existe, não necessita de proteção. Nas palavras de Gilmar Ferreira Mendes (2017, p.255) “o direito a vida é premissa dos direitos proclamados pelo constituinte; não faria sentido declarar qualquer outro se, antes não fosse assegurado o próprio direito de estar vivo para usufrui-lo”.

Podemos dizer que o direito a vida é a base que estrutura a aplicação de todos os outros direitos previstos em nossa Constituição “o constituinte brasileiro, coerentemente, proclama o direito a vida, mencionando-o como o primeiro dos cinco valores básicos que inspiram a lista dos direitos fundamentais enumerados no artigo 5° do texto constitucional” (MENDES, 2017). Esse direito é um direito supremo, é o direito que nasce com o homem, pois a partir de seu nascimento, o ser humano o adquire como um bem maior.

A proclamação desse direito justifica todo o ordenamento jurídico, na medida em que este só funciona a partir daquele. “Proclamar o direito á vida responde a uma exigência que é prévia ao ordenamento jurídico, inspirando-o e justificando-o. Trata-se de um valor supremo na ordem constitucional, que orienta, informa e dá sentido último a todos os demais direitos fundamentais” (MENDES, 2017).

Pelo direito a vida, temos a consonância com todos os outros, isto porque, podemos concluir que todos os outros direitos estão envolto a ele. Um dos grandes pontos deste direito é que o ordenamento jurídico funciona a sua volta e, ironicamente, dependendo dele, pois como visto anteriormente; se a sociedade necessita do direito para existir de modo pacífico e possível, também é válido ressaltar que sem a sociedade seria impossível à existência do direito. Assim também funciona com o direito a vida, pois sem ele todos os outros direitos perderiam seu sentido.

4.4. O suicídio e o jogo que o incentiva por meio da internet

Pode-se dizer que este, apesar de ser um dos assuntos mais polêmicos, ainda é um verdadeiro tabu para a sociedade atual, além de ser um dos poucos assuntos debatidos entre a população e até mesmo pela mídia. Existe uma frase popular em que dizem: “não é porque não vemos que não existe” referido dito popular pode se adequar perfeitamente ao suicídio, pois ainda que não seja um tema debatido com vigor em nossos dias atuais, não quer dizer que não ocorra o tempo inteiro entre diversas raças e até mesmo classes sociais.

O suicídio pode ser considerado o ato voluntário e consciente de tirar a própria vida, ou, nas palavras de Émile Durkheim (2000, p.11)30 “chama-se suicídio toda morte que resulta mediata ou imediatamente de um ato positivo ou negativo, realizado pela própria vítima”. Ou, ainda, “chama-se suicídio todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de um ato, positivo ou negativo, realizado pela própria vitima e que ela sabia que produziria esse resultado” (DURKHEIM, 2000, p.14).

Em uma visão geral, o individuo que comete o ato de suicídio está desistindo de sua própria vida, do ato de existir. É como dispor do seu direito de estar e manter-se vivo, renunciando sua própria existência. Nas palavras do sociólogo Émile Durkheim (2000, p.13) “o suicídio é, antes de tudo, o ato de desespero de um homem que não faz mais questão de viver”.

Ainda que seja um assunto pouco discutido, muito já se tentou entender os motivos que levam um individuo a tirar sua própria vida. Para algumas pessoas o suicídio é um ato de covardia de desistência humana por fraqueza ao enfrentar seus próprios medos, para outras nada mais é do que o ato de individuo que chegou ao seu limite físico e emocional. Muito se fala em causas que levam a tal ato, como, por exemplo, a depressão, síndrome do pânico, entre outras doenças estudadas no campo da psicologia. Resta a indagação “o suicídio é um homicídio intencional de si mesmo?” (DURKHEIM, 2000, p.12).

O que podemos afirmar é que o suicídio está ligado diretamente à intenção do agente, e a intenção é uma característica muito subjetiva de cada ser humano, não podendo ser presumida por quem a analisa de maneira externa. “A intenção é algo muito intimo para poder ser apreendida de fora, a não ser por aproximações grosseiras” (DURKHEIM, 2000).

As razões podem ser diversas, mas o pensamento suicida pode ser mais frequente do que imaginamos, segundo o Centro de Valorização da Vida em uma pesquisa realizada pela Unicamp, 17% dos brasileiros, em determinado momento da vida pensou em tirar a própria vida e, desses, 4,8% chegaram à fase de cogitação para isso. Além disso, estima-se que de 10 a 20 milhões de pessoas tentam o suicídio a cada ano31.

Por outro lado, é certo que um indivíduo que começa a evoluir a intenção de suicídio, nem sempre a demonstra, mas é certo que encontra-se em estado de vulnerabilidade, podendo ser manipulado. A intenção, por si só, não determina que de fato o indivíduo realizara o ato de tirar sua própria vida, mas pode facilmente ser induzido por mentes criminosas que buscam o sofrimento alheio. Existindo a intenção, o induzimento ao suicídio pode levar o individuo a executa-lo e, infelizmente, a internet tem sido uma ferramenta para tal prática.

No ano de 2016, o mundo ficou em alerta com o jogo chamado “Baleia Azul” que ao ser criado, passou a viralizar por meio da internet, arrastando diversos jovens e adolescentes. O jogo baleia azul, presumidamente teve seu inicio na Rússia e se propagou pelo mundo inteiro, o nome vem da tradução direta russa onde é chamado de “Siniy Kit”. Acredita-se que o nome foi criado a partir de uma música da Banda de Rock russa de nome Lumen em que diz: “por que gritar/se ninguém ouve/ o que estamos falando”?32

Após sua criação, o jogo foi introduzido na rede social russa de nome Vkontakte e partir daí passou a ser conhecido por pessoas do mundo inteiro. Estima-se que a Rússia possuí uma das maiores taxas de suicídio entre a população jovem33

Somente pelo nome, o jogo parece inofensivo, sem causar qualquer tipo de alerta ou atenção especial, no entanto, o modo de interação e a forma como jogar, nada mais são do que a prática de incitar e propagar o suicídio pela internet.

Composto por diversos “curadores” ou “administradores” como são chamadas as pessoas que levam outras a entrar no jogo e a elas passam os diversos desafios, o jogo possui apenas o objetivo de causar dor e eliminar a vida de seus participantes. Os curadores são responsáveis por introduzirem a maior quantidade de jogadores possíveis e, em sua maioria, são jovens e adolescentes.

Em suma, o jogo possui cinquenta desafios. Ao iniciar o jogo, o indivíduo deve realizar um juramento em que promete que não irá desistir dos desafios cumprindo-os até final, sob a ameaça de ser morto, caso desista. Entre os desafios, o participante deve, com o auxilio de um estilete mutilar-se até que se forme o desenho de uma baleia e, logo em seguida, enviar aos moderadores para comprovar que de fato o desafio fora cumprido.

Entre referidos desafios, o ultimo deles leva o participante a tirar sua própria vida como uma forma de demonstrar sua “coragem”.

O jogo causou alerta, pois jovens de todo o mundo estava conectando-se a essa “cultura suicida” de forma natural e com humor. Nota-se que o objetivo principal do jogo é apenas incitar o suicídio, levando suas vítimas a filmarem cada passo de seu sofrimento.

Investiga-se que o jogo tenha levado diversos jovens ao suicídio, no entanto, em alguns casos não restou comprovado a relação com o jogo. No Brasil foram noticiadas dezenas de suicídios cometidos por jovens e adolescentes com ligação direta ao jogo suicida Baleia Azul 34.

É importante destacar que o jogo, ainda que realizado por meio da internet, possui o condão de incentivar uma ideia pré-existente. Pois, os criminosos buscam pessoas em estado de fragilidade, garantindo, assim, o sucesso da empreitada, neste caso, o jogo funciona como um meio de incentivo ou estímulo para a consumação do suicídio que já existia na mente do jogador.

O jogo acaba sendo um meio de propagar a cultura do suicídio, de forma que ele não só incentiva o jogador que já tenha um perfil suicida como também insere essa ideia àqueles que jamais pensaram na possibilidade. Além disso, o jogo impõe o suicídio e a mutilação como uma forma de “moda” para os adolescentes, fazendo com que acreditem que essa é a melhor maneira de chamar a atenção dentro da sociedade.

Como visto anteriormente, a Rede Mundial de Computadores, infelizmente, também é frequentada por criminosos que buscam a fragilidades das pessoas para alimentarem a sua busca insaciável pela prática de crimes e, nesse ponto, podemos afirmar que os adolescentes são as vítimas em potencial, uma vez que são os mais assíduos frequentadores da internet e, por muitas vezes, sem o monitoramento dos pais.

O jogo veio perdendo força desde a metade do ano de 2017, no entanto, deixou vítimas e ainda diversos casos a serem investigados. Por tais motivos, o maior alerta e a melhor forma de combater essas praticas criminosas é a educação digital, na medida em que alerta os internautas sobre os riscos de estarem conectados e de como não serem mais uma vítima.

4.5. O suicídio na perspectiva do Código Penal

Para a legislação brasileira, o suicídio, por si só, não constitui crime e, por isso, não é punido em nosso Código Penal, assim como, também, a lei não incrimina o individuo que tentar o suicídio e não conseguir consuma-lo por circunstancias alheia a sua vontade, isto porque, “o legislador entendeu que a punição nesse caso teria apenas efeitos negativos, como, por exemplo, reforçar a ideia suicida” (GONÇALVES, 2011)35.

Em contra partida, vigora sobre o ato de suicídio o principio da alteridade. Criado por Claus Roxin, tal principio consiste na ideia de que ninguém poderá ser punido por causar mal apenas a si mesmo, neste ponto, a conduta somente será penalmente relevante se transcender seu autor e atingir bem jurídico de outrem36. No caso do suicídio ou de sua tentativa, o autor do ato visa tirar sua própria vida, de modo que atinge somente o seu bem jurídico maior, ou seja, sua própria vida.

Não cabe ao direito penal adentrar na conduta do individuo que queira fazer mal a si próprio, pois seu objetivo é proteger o bem jurídico de um individuo contra a conduta de lesão ou ameaça de lesão a do outro. Neste aspecto, se o direito penal viesse a interferir na decisão de um individuo sobre lesar os seus próprios bens jurídicos, haveria confronto direto com a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, previstas no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988. Para o direito penal só será penalmente relevante a conduta que vier a ferir bem jurídico alheio, pois cada um tem a liberdade de escolher como quiser, o que fazer com sua própria vida.

O que muitas pessoas não sabem, é que apesar do suicídio ou a sua tentativa não ser punida pelo nosso Código Penal, houve a preocupação do legislador, no sentido de coibir qualquer conduta que venha para induzir, instigar ou auxiliar um individuo a realizar o ato de suicidar-se. Nesse sentido “o legislador tornou ilícita a participação em fato não criminoso” (GONÇALVES, 2011), pois apesar do suicídio ou de sua tentativa não constituir crime, qualquer um que venha a cooperar com sua consumação será punido penalmente.

O crime acima mencionado está previsto no artigo 122 do Código Penal:

Art.122 – Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxilio para que o faça: Pena – reclusão de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Referido crime, também pode ser chamado de “participação em suicídio” porque tem como finalidade, punir aquele que contribui para o suicídio alheio. Estará sujeito às penas deste crime o indivíduo que realizar uma das condutas definidas no tipo penal, quais sejam, induzir, instigar ou auxiliar. Para entender melhor esse tipo penal, é importante analisar cada um de suas condutas de forma minuciosa.

O verbo induzir consiste em dar a ideia do suicídio ao individuo que sequer já tenha cogitada essa possibilidade em determinado momento de sua vida, neste caso, o sujeito ativo deste crime, faz com que o sujeito passivo passe a ter essa ideia, ou seja, é como se plantasse a ideia de suicídio na mente de um individuo. Segundo Victor Eduardo Rios Gonçalves (2011, p.44) “na história recente, há vários acontecimentos que se integram a essa hipótese, ligados, basicamente, a líderes de fanáticos religiosos, que estimulam o suicídio em massa de seus seguidores”.

Já o verbo instigar é aquele em que o indivíduo reforça a ideia de suicídio que já existe, porquanto o sujeito ativo apenas contribui para que a vítima que já pretende o suicídio, de fato, a efetive. Um exemplo a ser dado neste caso é o da pessoa que se encontra no alto de um edifício prestes a se jogar e outra ao ver referida cena, contribui, com gritos, para que o suicida efetivamente se jogue (GONÇALVES, 2011). Neste caso, o individuo não só concorda com a ideia do suicídio, como também a incentiva. “No induzimento, a ideia de suicídio ainda não havia passado pela cabeça da vítima. Na instigação, por outro lado, a ideia já havia surgido na vítima e o sujeito a estimula. O induzimento e a instigação são chamados de participação moral” (GONÇALVES, 2011, p. 45).

Por fim, o verbo prestar auxílio refere-se ao ato de contribuir materialmente com o ato do suicídio, seja por meio de empréstimos de objetos, ou dando instruções de como realizar o suicídio. Aqui é importante ressaltar que o auxilio deve ser realizado de forma secundária, pois se a morte da vítima ligar-se diretamente ao auxílio prestado estará caracterizado o crime de homicídio previsto no artigo 121 do Código Penal. Este seria o caso de quem intentando auxiliar a vítima, aperta o gatilho, ou a empurra de um prédio, uma vez que apesar de haver o consentimento da vítima, ele não é valido, porquanto a vida é um bem indisponível. Aqui seria impossível falar-se em crime de participação em suicídio já que a conduta praticada não seria a de suicídio. Neste verbo, o auxílio é uma espécie de participação material.

Um dos pontos importantes a serem destacados é que para que haja a configuração do crime de participação em suicídio a vítima deve tirar a vida de forma consciente e voluntária, pois se realizar o ato de suicídio de forma inconsciente e involuntária, então estará configurado, também , o crime de homicídio. Sendo assim, se a vítima é coagida por meio de violência ou grave ameaça a ingerir alguma substancia nociva ou a desferir uma facada em seu próprio peito, não haverá suicídio, pois a vítima não possuía a intenção de se matar (GONÇALVES, 2011).

Superada a questão das modalidades, é importante destacar as consequências quanto a consumação e a tentativa. O Código Penal deixa claro quanto a possibilidade de punição somente quando de fato se efetivar a morte da vítima ou da tentativa de suicidar-se resultar lesões graves. No primeiro caso, o Código Penal prevê pena de dois a seis anos e no segundo de um a três anos.

Nota-se que a lei não pune o individuo que tenta se matar ou se tentando sofra apenas lesões leves, isto porque não há previsão legal, sendo assim, o individuo que tente se matar e, dessa tentativa resulte apenas lesões leves não será punido, bem como o individuo que o ajudou, pois estaríamos diante de um fato atípico e não previsto em lei. “Por isso, o crime somente se consuma no momento da morte da vítima ou, no segundo caso, quando ela sofre lesões graves” (GONÇALVES, 2011, p. 46).

É preciso estar atentar-se para a questão da tentativa, pois a tentativa cometida pelo individuo que queira se matar não se confunde com a tentativa prevista no tipo penal do art.122 que resulta lesões graves a vítima. Segundo Victor Eduardo Rios Gonçalves (2011, p.46):

A tentativa que teoricamente seria possível não existe porque a lei só pune o crime quando há morte ou lesões graves e, nesses casos, o crime está consumado. Com efeito, se a vítima sequer tenta o suicídio ou sofre apenas lesões graves, entende-se que o crime está consumado, uma vez que, para esse caso, já existe pena autônoma na própria parte especial do Código Penal, sendo, portanto, desnecessária a combinação com a norma de extensão do art.14, II, do Código Penal que trata da tentativa.

Por tais motivos, é certo dizer que o crime previsto no art.122 do Código Penal, não admite tentativa, não podendo, no entanto, ser confundido com a tentativa de suicídio que não só existe como se refere ao ato em si mesmo.

Sobre este tipo penal, também há possibilidade da existência do ambicidio ou o chamado “pacto de morte” que ocorre quando duas pessoas combinam ou incentivam-se uma a outra a cometer suicídio, seria como o famoso e mais conhecido caso de “Romeu e Julieta”, duas pessoas firmando um pacto de morte para suicidar-se juntas.

Neste caso há peculiaridades sobre o tipo penal de participação em suicídio, pois se havendo o pacto de morte uma pessoa se mata e a outra desiste, esta responderá pelo crime previsto no art.122 do Código Penal. O mesmo irá ocorrer se ambas as pessoas realizarem o ato suicida, mas este não se efetivar causando lesão corporal de natureza grave em uma e lesão corporal de natureza leve na outra, esta ultima responderá pelo crime e outra não será punida, pois no caso de lesão corporal de natureza leve o fato é atípico.

Ainda, há casos em que ambas as pessoas pactuam que uma irá atirar na outra e logo em seguida irá se matar. Neste caso se a pessoa autora do disparo sobreviver, responderá pelo crime de homicídio, no entanto, se ocorrer situação inversa, onde quem morrer for a autora do disparo a outra responderá pelo crime de participação em suicídio.

Quanto a classificação doutrinária desse tipo penal, pode ser classificado como um crime material, pois para que haja a sua consumação, é necessário o resultado morte ou lesão grave, além disso pressupõe efetiva lesão ao bem jurídico e consuma-se em um momento determinado e certo, ou seja, no momento em que efetivamente a vítima venha a morrer ou sofrer lesões graves, não bastando o ato de induzir, instigar ou auxiliar.

O parágrafo único do art.122 também atribui causas de aumento de pena no crime de participação em suicídio:

“Art.122 - §º único: A pena é duplicada: I – se o crime é praticado por motivo egoístico; II – se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência”.

Neste caso, a pena será aplicada em dobro quando:

  1. O crime for praticado por motivo egoístico. Ocorre quando o autor do crime possui algum interesse e queira tirar alguma vantagem, seja econômica ou não, da morte da vítima. Um exemplo é a pessoa que possui interesse na herança da vítima, para ficar com seu cargo no trabalho, etc.

  2. A vítima for menor. Segundo entendimento doutrinário, essa causa de aumento de pena irá ocorrer quando a vítima for maior de 14 anos e menor de 18 anos. Caso a vítima seja menor de 14 anos, o crime será o de homicídio, pois entende-se que abaixo dessa idade a pessoa ainda não tem total entendimento do ato que irá praticar, sendo absolutamente vulnerável. Sendo assim, cometido contra pessoa com 18 anos configura-se o crime de participação em suicídio em sua modalidade simples; contra pessoa com 14 anos ou menor de 18 anos configura-se o crime de participação em suicídio em sua modalidade agravada e, por fim, contra pessoa menor de 14 anos, será sempre o crime de homicídio.

  3. A vítima tiver diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. Essa agravante se dá quando o indivíduo se aproveita de um momento de fragilidade da vítima para apresentar a ela a ideia de suicídio, como, por exemplo, nos casos de depressão, embriaguez, etc.

Feita tais análises, destacamos que, como visto no título anterior, os criadores, curadores e administradores do jogo baleia azul, se enquadram perfeitamente neste crime e não somente pelo caput, mas sim em sua forma agravada, na medida em que praticavam o ato de induzir e instigar adolescentes a cometerem suicídio, aproveitando-se do estado de vulnerabilidade dessas vítimas.

Ainda que fuja ao conhecimento comum das pessoas, qualquer brincadeira que surja na rede e, tenha como finalidade o ato de estimular o suicídio ou causar as vítimas lesões de natureza grave pela tentativa deste, é crime tipificado em nosso Código Penal com punição de reclusão, não havendo qualquer óbice a aplicação da legislação penal já existente, o fato de ser cometido por meio da internet.

É importante estar atento, nem toda brincadeira é inofensiva e nem todo amigo virtual possui boas intenções, a internet nos proporciona muitos benefícios, mas ainda é um espaço desconhecido e como visto, também pode ter o seu percentual sombrio.

5. OS CRIMINOSOS E A INVENSTIGAÇÃO DO CRIME PRATICADO POR MEIO DA INTERNET

5.1. O criminoso virtual

É muito difícil delimitar um perfil ao criminoso virtual, não dá para afirmar os modos como pensa ou como cogita a pratica do crime, embora já haja diversos estudos neste sentido. Não dá para saber quem são ou quando irão cometer um novo crime, não há como presumir suas formas de ataque ou planejamento sob o mundo virtual. Porém o que se pode afirmar, com plena certeza é que os criminosos passaram a ser encorajados com o surgimento da internet, isto porque ela proporciona uma falsa sensação de anonimato e consequente impunidade para os crimes praticados por meio dela e este, sem sombras de dúvidas é o maior incentivo para o criminoso virtual.

Um indivíduo pode simplesmente não ser um criminoso na vida real, mas quando percebe a facilidade de obtenção de vítima e a camuflagem digital a qual pode se socorrer ele passa a se interessar por este tipo ilícito de vida. “Pode-se dizer também que os criminosos digitais, em sua maioria, não praticam crimes do mundo real, porém interessam-se pela prática delituosa virtual” (JESUS, 2016)37. Se o agente possui prévio conhecimento sobre as possibilidades da internet, além de conhecer a fragilidade do sistema investigativo para este tipo de delito, ele tem em mãos o incentivo de que precisa, ou seja, anonimato.

Ainda que haja ampla tipificação penal para os crimes comuns que venham a ser praticados por meio da Rede Mundial de Computadores, os criminosos que buscam suas vítimas por este meio, se socorrem na ideia de restarem desapercebidos ante as autoridades competentes. Por tal motivo, traçar o perfil de um criminoso virtual não é tarefa fácil, porém sabemos os exatos motivos que os levam a buscar as suas vítimas na rede.

Quando se falava em criminoso virtual, a ideia que se tinha era os hackers ou crackers, pessoas com um alto conhecimento técnico sobre o mundo da informática, mas atualmente essa realidade mudou, na medida em que não é necessário nenhum conhecimento altamente evoluído sobre computador para praticar crimes comuns na internet. Segundo Damásio de Jesus (2016, p.57) “o crime cibernético no Brasil está menos técnico e muito mais criativo”.

A criatividade passou a ser o ponto chave para cometer delitos na internet, considerando que nada poderia atrair mais a vítima do que o poder da persuasão, por isso, ser criativo é mais favorável aos criminosos virtuais do que o próprio conhecimento técnico sobre a rede, sendo assim podemos afirmar que o planejamento para a pratica de crimes através do computador passou a exigir somente os artifícios da mente humana.

O perigo mora exatamente neste ponto, de certo que em tempos passados não era qualquer indivíduo que tinha conhecimento tão avançado para praticar crimes através da rede, no entanto, quando a chave importante para a pratica destes atos ilícitos passou a ser apenas a criatividade, o número de crimes e criminosos aumentaram significativamente, tornando os números cada dias mais alarmantes.

O maior ponto de encorajamento para o criminoso virtual é a vulnerabilidade das vítimas. Conforme o crime anteriormente estudado e a maior parte dos outros crimes previstos em nosso Código Penal, o criminoso virtual não precisa ser um expert informático para pratica-lo, na verdade, ele só precisa de um computador ou smartphone, uma mente com grande poder de persuasão e uma vítima em estado de vulnerabilidade. Além disso, há um grande défit de conhecimento por parte dos usuários sobre a internet e isso facilita em grande porcentagem a prática dos crimes “a realidade, hoje, é que grande parte dos crimes digitais se deve a ignorância dos usuários” (JESUS, 2016). Não é rara às vezes em que a própria vítima acaba contribuindo com o criminoso virtual, justamente pelo seu escasso conhecimento ou falta de preparo sobre o mundo virtual e, conhecendo esse ponto fraco dos internautas, os criminosos desenvolvem o seu intento sem maiores percalços.

O criminoso virtual, nada mais é do que o indivíduo que satisfaz o seu anseio no sofrimento alheio, afinal, não dá para concluir que a única causa dos crimes virtuais seja o dinheiro, pois se assim o fosse não veríamos, com frequência, a prática do crime de pedofilia, pornografia infantil, auxilio ao suicídio, etc. Nestes casos, basta para o criminoso alcançar a confiança de suas vítimas, o que, na maioria das vezes, não é uma tarefa árdua, na medida em que a internet é o mundo dos personagens e fantasias, nem sempre a realidade é aparente e as pessoas acabam se prendendo a meras alegações, afinal, o outro lado da tela é desconhecido e, às vezes, perigoso.

Com efeito, não é possível determinar quem sejam esses criminosos, podem ser adolescentes, jovens e adultos que desenvolveram esse perfil criminoso a partir do conhecimento da facilidade em atrair suas vítimas. É interessante o fato de que qualquer pessoa ao ser abordada por um estranho na rua, sinta-se em estado de alerta, porém quando esta mesma pessoa é abordada por um estranho, através de redes sociais, chats e bate papos tende a atende-lo sem qualquer receio, e os criminosos virtuais sabem disso.

Estes criminosos aprenderam e conheceram não só o espaço, mas a fragilidade das vítimas e o atraso nos meios de investigação para tais crimes, sendo assim, o que antes exigia um vasto conhecimento tecnológico, passou a ser apenas questão de tempo e criatividade. Infelizmente, “a violência, muitas vezes não fica evidenciada – em vez de armas, são utilizados teclados e modems” (GOUVÊA, 1997)38.

Não há parâmetro para identificar um criminoso virtual a partir do momento em que não se necessitou ser um gênio da informática para praticar delitos na rede, porque qualquer pessoa, ainda que minimamente, possui conhecimento informático, além de possuir acesso à internet. Em outras palavras o criminoso virtual pode ser qualquer pessoa, dos mais novos aos mais velhos, aqueles com conhecimentos mais elevados e os menos favorecidos. O que de fato implica para a prática destes crimes, é que os criminosos sabem onde encontrar suas vítimas, sabem que estão “protegidos” pelo anonimato e sabem que os meios de investigação ainda são morosos. Enquanto eles veem as vítimas, as vítimas não fazem ideia de que estão sendo apenas um alvo.

Pode-se concluir que, atualmente, os criminosos nascem não só do conhecimento avançado sobre a tecnologia informática, mas sim pela oportunidade entre a facilidade digital e a vulnerabilidade das vítimas. Como anteriormente citado, basta que o indivíduo tenha acesso a internet e um meio de utiliza-la para se tornar um criminoso. De acordo com as palavras de Damásio de Jesus (2016, p.57)39 “a oportunidade fez com que qualquer pessoa pudesse ser um criminoso digital em potencial”.

Além de sites de anúncios, com o crescimento da internet surgiram diversas redes sociais, bem como aplicativos que proporcionam a troca de mensagens instantaneamente, como é o caso do whatsapp. Essas redes sócias podem ser facilmente utilizadas pelos criminosos para atrair as suas vítimas, uma vez que não há mecanismos que garantam uma navegação segura. Por muitas vezes, na internet, a única segurança será a precaução do próprio internauta.

Em outra vertente, os criminosos se utilizam da rede social para gabar-se de seus crimes, segundo RJ Parker (2015, p.239)40 “o homem é um animal social, e o criminoso possivelmente mais ainda”, veja-se que os criminosos que cometem crimes por prazer, possuem o grande impulso de mostrar o quanto orgulha-se de sua conduta, afinal, onde mais poderia torna-la tão pública, se não por meio da internet?

Mesmo que seja impossível determinar os motivos que levem uma pessoa a praticar crimes, o que se sabe é que todas elas são movidas por diversos fatores psicológicos: seja por ciúmes, por raiva, seja para atrair atenção, saciar uma patologia psiquiátrica ou até mesmo pelo simples prazer de provocar o sofrimento alheio. O grande fator, é que por meio da Rede Mundial de Computadores, a prática destes crimes se tornou comum, uma vez que os criminosos sentiram-se encorajados a consumar o que antes, poderia ser apenas uma cogitação.

Infelizmente, a rede trás grandes benefícios, porém, facilita a ação de criminosos espalhados por todo o mundo e, considerando que os meios de investigação para a pratica desses crimes ainda é uma grande barreia a ser derrubada pelas autoridades, cabe, enquanto há lacunas investigativas, ao internauta navegar com cautela.

5.2. Do tempo do crime e da competência

De acordo com o nosso Código Penal, considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado (art.4, CP). Nesse sentido, foi adotada pela nossa legislação penal, a teoria da atividade que determina que a imputabilidade do agente será aferida no momento em que praticar a conduta criminosa, independentemente do momento em que venha ocorrer o resultado (CAPEZ, 2014).

Considerando o crime de auxilio ao suicídio, sabemos que por se tratar de um crime material, ou seja, que exige efetivamente um resultado para a sua consumação, devendo a vítima efetivamente praticar o ato suicida ou de sua tentativa sobrevir lesões de natureza grave a vítima, é muito provável que a sua consumação nem sempre venha ocorrer no mesmo momento em que o agente praticou os verbos descritos no tipo penal.

Feitas tais considerações, teríamos que a conduta do agente que pratica o crime de auxilio ao suicídio, seria imputada a ele no momento da efetiva consumação, no entanto, o tempo do crime seria aquele em que o agente praticou os verbos induzir, instigar ou auxiliar o suicídio de terceira pessoa. Em outras palavras, este tipo penal, ao ser praticado por meio da internet, somente será imputado ao agente no momento da consumação do ato suicida, mas há de se ressaltar, que ainda que em outro momento ocorra o resultado, o tempo do crime será aquele em que o agente praticou o tipo penal.

Sendo assim, se uma pessoa induz a outra, por meio de mensagem em chat de rede social, a cometer suicídio, em tese, ainda não estaria praticando referido crime, porém, após dois meses o destinatário decide de fato tirar sua própria vida, então estaria referido crime consumado e ao agente remetente da mensagem imputada a conduta tipificada pelo art.122 do Código Penal, tendo como tempo do crime, o dia em que enviou a mensagem a vítima. Nota-se que, ainda que o crime ocorra hoje, e o seu resultado somente minutos, horas ou meses depois, o tempo do crime será o da conduta e não o do resultado.

Nesse sentido, o crime praticado por meio da internet, em nada poderia interferir no tempo do crime, no entanto, o mesmo não se pode dizer com relação a competência dos crimes praticados por meio da internet. Veja-se que enquanto o tempo do crime busca determinar o tempo em que o crime foi praticado, o lugar, por outro lado, busca determinar o lugar em que este crime será punido.

A grande problemática encontrada é que a internet compartilha-se com o mundo inteiro, dessa forma, um conteúdo liberado na rede é acessado por milhões de pessoas em questão de horas, isto porque não possui fronteira, tampouco dono. Dessa forma, quando fala-se em crimes praticados por meio da internet o resultado pode ocorrer em qualquer lugar do mundo, ou seja, o criminoso pode facilmente daqui do Brasil praticar um crime com a intenção de afetar uma vítima que esteja no exterior.

Nas palavras de Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2004, p.78)41 “um dos maiores problemas que se enfrenta, no combate aos crimes cometidos através da internet, é a questão da competência”. Não dá para ter controle absoluto sobre o ambiente virtual e isso aumenta a pratica de crimes, restando a dúvida quanto a forma de punição e onde ela irá ocorrer nos casos dos crimes cometidos através da rede.

O art.6º do Código Penal preceitua que: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir o resultado”. Neste caso, a teoria adotada é a teoria da ubiquidade que determina que o foro competente será tanto o do lugar da ação ou omissão quanto o do lugar que se produziu ou deveria se produzir o resultado (CAPEZ, 2014).

Essa teoria rechaça boa parte da problemática da competência dos crimes praticados por meio da internet, pois caso a conduta seja praticada em território nacional e o resultado ocorra fora dele, tanto o foro da conduta quanto o do resultado será competente para julgar determinado crime. Imaginamos que uma pessoa envie uma mensagem aqui do Brasil para outra que se encontre na Alemanha, instigando-a a cometer suicídio e esta efetivamente tire sua própria vida, tanto o foro do Brasil quanto o da Alemanha será competente para processar e julgar referido crime. Nota-se que a conduta fora praticada aqui, porém o resultado ocorreu em outro país, no entanto, tais argumentos não é óbice para punição do crime, uma vez que referida situação encontra-se tipificada em nossa legislação penal.

Por sua vez, a teoria da ubiquidade do art.6º do Código Penal, mostra-se a mais eficaz para o combate aos crimes cometidos através da internet, porquanto soluciona a grande questão da ausência de fronteiras deste mundo virtual, além de acompanhar todas as fases do iter criminis. Pouco importará se o crime tenha atingido dois lugares diferentes, pois em consonância com o art.6º do Código Penal, o art.70,§1º, do Código de Processo Penal determina que o foro competente será o do lugar em que foi praticado o ultimo ato de execução no Brasil ou o local brasileiro onde se produziu o resultado.

Com efeito, é importante lembrar-se da situação em que o autor do crime esteja fora do território nacional, uma vez que, pessoas que estejam vivendo em outro Estado também pode perpetrar uma conduta criminosa contra quem no Brasil estiver. Segundo entendimento de Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2004, p.84) “o usuário da internet, nem sempre, comete o delito dentro do território nacional. Como proceder, nos casos em que o usuário do computador encontra-se fora do Brasil, e o dano, a infração penal, ocorre em nosso país?”

Sendo o crime praticado em outro país, vindo a atingir bem jurídico tutelado no território nacional estará sujeito a previsão do art.7º, II, a e b, do Código Penal que dispõe que está sujeito a lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro os crimes que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir ou aqueles praticados por brasileiros. Em consonância com referido artigo, o Código de Processo Penal em seu art.88, estabelece que no processo por crimes praticados fora do território brasileiro, será competente o juízo da Capital do Estado onde houver por ultimo residido o acusado e, caso este nunca tiver residido no Brasil, será competente o juízo da Capital da República.

Outro tema que muito se discute é a competência da Justiça Federal aos crimes praticados por meio da internet, uma vez que é de interesse da União a segurança da Rede Mundial de Computadores (art.109, IV, CF/88), no entanto, é importante lembrar-se que nem todos os crimes praticados através da internet serão de competência da Justiça Federal, isto porque, existem ressalvas para determinar a competência. Além disso, se tornou entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça que o simples fato do delito ter sido cometido pela rede mundial de computadores não atrai, por si só, a competência da Justiça Federal.

Segundo o art.109, V da Constituição Federal de 1988 será de competência dos juízes federais os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente. Muito embora haja a preocupação em determinar a competência da Justiça Federal aos crimes praticados por meio da internet, o referido artigo supra, determina que para a competência vir a ser da Justiça Federal o crime deverá estar previsto em tratados ou convenção, como, por exemplo, o tráfico de drogas, a pornografia infantil, o racismo e o tráfico de pessoas. Para atrair a competência da Justiça Federal é necessário que estejam presentes os pressupostos do art.109, IV, da CF/88, quais sejam, transnacionalidade e tratado.

Sendo assim, somente serão de competência da Justiça Federal, os crimes praticados através da internet que sejam públicos, ou seja, que sejam publicados em sites abertos (redes sociais, comentários em portais, blogs, etc), tornando-se a conduta e a ofensa pública a todos que tenham acesso á internet e, desde que esteja a conduta ilícita prevista em tratado ou convenção internacional. Portanto, o crime será de competência da Justiça Federal se for cometido por meio publico e se estiver previsto em tratado, isto porque, o crime que é praticado em sites abertos alcança o mundo inteiro, considerando que a internet não possui fronteiras, daí decorrendo a sua transnacionalidade.

Um exemplo que pode ser adotado para o seguinte caso é o crime de injúria cometido pela internet, referido crime, ainda que seja praticado publicando-se a ofensa em site aberto, não atrairia a competência da Justiça Federal, uma vez que não se encontra previsto em tratado, sendo, portanto, de competência da Justiça comum Estadual. De outra sorte, um crime de pornografia infantil, que venha a ser praticado por meio de sites abertos, atrai a competência da Justiça Federal, pois além de alcançar a transnacionalidade ele encontra-se previsto em tratado. Em outras palavras, qualquer crime que não se encontre dentro destes pressupostos, ainda que praticado por meio da internet, será de competência da Justiça comum Estadual, pois como estudado, a internet, por si só, não atrai competência federal.

Nota-se que muito embora a internet seja uma tecnologia nova e ainda desconhecida, o Código Penal, bem como a nossa Constituição Federal de 1988, não se ausentou de legislar sobre a competência para os crimes que nela viriam a ser praticados, por este motivo, ainda que muito tenha que se aprimorar a legislação no que se refere ás novas tecnologias, não poderíamos dizer que há lacunas deixando crimes virtuais empunes. Por mais complexos que sejam os crimes cometidos através das tecnologias informáticas, a nossa legislação, ainda que deficiente, nunca deixou desamparo, não podendo ser atribuída a ela o déficit no combate a referidos crimes.

5.3. Da investigação da responsabilidade dos provedores de internet nos crimes praticados através da internet

Podemos dizer que a investigação criminal nos crimes praticados através da internet é a maior barreira que se encontra para combatê-los, isto porque os meios de investigação ainda são escassos e morosos. Se a legislação veio dando os seus primeiros passos em direção a regulamentação deste novo meio de praticar crimes o mesmo não pode se dizer com relação a investigação destes crimes, pois a internet ainda é um enigma a ser desvendado até mesmo para as autoridades. Segundo Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2004, p.73)42 “o primeiro problema a ser enfrentado, nos delitos cometidos por meio da internet, é o da autoria, isto é, da identificação do autor da infração penal”.

Chegar á autoria de um crime praticado através da internet é uma tarefa árdua, na medida em que certamente o criminoso virtual possui conhecimentos básicos do funcionamento informático, sendo assim não irá utilizar a rede sem os devidos cuidados para alcançar sua finalidade. Sabemos que a Rede Mundial de Computadores garante um certo anonimato e aproveitando-se disso o criminoso virtual sempre irá utilizar perfis com dados falsos, justamente para dificultar a investigação da autoria “quase nunca, a pessoa que pretende cometer uma infração penal, utiliza sua identificação pessoal real” (INELLAS, 2004). Sempre haverá situações em que o criminoso se utilizará de dados de terceiros ou informações alheias como identificação pessoal para praticar delitos na rede. É exatamente por este fato que a investigação torna-se de difícil conclusão.

Nota-se que o criminoso virtual não é encontrado de forma visual ou por meio de documentos de identificação, o que determina um ponto importante para se chegar a um infrator na rede é o endereço do computador que esteja utilizando. Referido endereço é conhecido como IP (Internet Protocol), o IP é uma espécie de identificador de um dispositivo, é por meio dele que se consegue identificar um usuário e a sua localização, pois ele envia informações da máquina á internet. Como bem pontua Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas (2004, p.73) “daí a importância da cooperação das Provedoras de Acesso”.

Nota-se que até o advento da Lei 12.965/2014 não havia previsão legal de responsabilidade das provedoras de acesso, sendo assim, as investigações em relação aos crimes praticados através da internet era de maior complexidade. O Marco Civil da Internet veio com o propósito de regular esse espaço virtual que, até então, carecia de legislação especifica no âmbito jurídico, posto que a ideia que vigorava era a de que a internet se quer, havia dono ou necessidade de legislação. O grande problema é que o espaço virtual não é apenas um aglomerado de conexões que se interligam e se conectam o tempo inteiro, na verdade, atualmente a internet é a sociedade em rede e, dessa forma, a ausência de legislação entre a relação de pessoas torna-se inviável.

Nesse sentido, o grande propósito da Lei 12.965/2014 foi legislar sobre direitos, garantias e deveres dos internautas, ressalta-se que o Marco Civil da Internet foi uma junção de direitos e deveres já existentes em nossa legislação, porém para se evitar a chamada “lacuna legislativa” o legislador se preocupou em fazer prevalecer tais direitos em lei especifica a Rede Mundial de Computadores. A criação do Marco Civil da Internet não foi apenas um avanço legislativo aos novos meios de comunicação, mas também um ponto importante para determinar a responsabilidade das provedoras de acesso. Destaca-se que a ausência de responsabilização das provedoras trazia maior instabilidade aos meios de comunicação virtual, isto porque, não havendo regulamentação, os conteúdos, matérias e comentários podem ser feitos livremente, causando um ambiente de comunicação temerário.

Não é que os homens sejam dependentes de leis, mas é absolutamente incontestável que são submissos a ela, o que garante a ordem em sociedade. Ocorre que com a criação da Lei 12.965/2014 as provedoras de acesso passaram a ser responsáveis de forma geral pela guarda de informações que venham a ser veiculada na internet por meio de sua prestação de serviços informático, isso, trouxe não somente uma pequena segurança, mas como também um novo ponto de partida as investigações dos crimes cometidos por meio da internet. “Até o advento do Marco Civil, no Brasil, inexistia lei que obrigasse os provedores de internet ou de serviços a registrarem logs das atividades de seus usuários” (JESUS, 2016)43.

A partir da criação do Marco Civil, o Brasil passou a ter legislações mais específicas com relação a internet, justamente para não se falar em impunidade por ausência de leis. No entanto, quando falamos em investigação aos delitos praticados por meio da rede, a problemática nunca fora somente a ausência de legislação especifica, uma vez que, o Código Penal não pode ser considerado omisso ou inaplicável aos delitos comuns, a grande problemática, por sua vez, sempre esbarrou na ausência de meios a se chegar a autoria.

O meio mais eficiente de se chegar a autoria de delitos cometidos através da rede é o endereço de IP (protocol internet), isto porque, quando o usuários se conecta na internet o faz por meio de um provedor de acesso a internet, é este provedor quem disponibiliza ao usuário o chamado IP entre um determinado período de tempo, enquanto perdurar a conexão. Referido acesso fica registrado e se o usuário interagir por meio de sites, blogs, e-mail, redes sociais, etc, terá seus dados captados por referidas aplicações por meio do registro de acesso a aplicações na internet, que guardará diversas informações sobre o uso da internet por tal usuário, como, por exemplo, data, hora, endereço de IP, aplicação acessada, etc.

Segundo Damásio de Jesus (2016, p.170):

Diante do uso criminoso de um serviço, ainda que de forma anônima, como, por exemplo, na criação de uma comunidade, grupo, ou pagina destinada a pornografia infantil, sabe-se que o provedor dos serviços (pago ou gratuito) registra os dados de acesso á aplicação.

Feitas tais considerações, é importante lembra-se que, no entanto, não é comum pessoas se utilizarem de rede alheia para estabelecer conexão e, assim, praticar os delitos livremente, por este motivo, o que normalmente se aconselha é que as redes Wifi estejam sempre protegidas por senhas, impedindo a utilização por terceiros desconhecidos, uma vez que ocorrendo tal fato, o responsável pela rede poderá ser responsabilizado pela ausência de segurança e precaução “pode ocorrer de o titular de uma conta de internet não ser o agente criminoso; neste caso, pode responder por ter negligenciado, permitindo que terceiros acessassem seus ativos” (JESUS, 2016).

Dessa forma, temos que sem a cooperação dos provedores de acesso a internet, seria quase impossível chegar a autoria de um crime praticado na rede. Em se tratando das provedoras de acesso, temos que de acordo com a Lei 12.965/2014, em seu artigo 18, elas não serão responsabilizadas civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiro, no entanto, cabe a elas a guarda de registros de acesso a aplicações de internet, justamente para efeitos de investigações. Os dados que ficarem sob a guarda de referidas provedoras serão de sigilo absoluto, somente podendo ser acessadas mediante ordem judicial, conforme o art.22, caput, da Lei 12.965/2014.

Já o art.19 do Marco Civil estabelece clara responsabilidade as provedoras de internet, caso estas, mesmo após ordem judicial especifica, não tomar as providencias para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente. Referido artigo visa atribuir responsabilidade as provedoras para que haja cooperação com a justiça e as autoridades competentes, na medida em que, tal cooperação possui extrema valoração no âmbito probatório na prática de um delito cometido através da rede. Segundo o entendimento doutrinário de Damásio de Jesus (2016, p.175) “não existe óbice, por fim, para eventual responsabilização criminal de diretores ou sócios de provedores de acesso ou de aplicações, desde que comprovada participação ou coautoria em crime informático ou crime cometido por intermédio da informática”.

No tocante aos meios investigativos, a Lei 12.735/2012, em seu art.4º, prevê que os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado. Menciona-se que neste ponto, a lei vem buscando aprimorar e avançar os meios de combate aos crimes praticados através da internet, mas há que se ponderar que a legislação é lenta com relação à tecnologia, neste sentido, temos que a maior problemática nas investigações destes delitos é a vagarosa criação de setores especializados no combate a estes crimes, uma vez que os criminosos sempre irão se aproveitar de identidades falsas, bem como de máscaras no IP utilizado para cometer delitos.

É sábido que o maior ponto de crítica quando falamos em crimes praticados por meio da internet, sempre foi a legislação especifica, porém, como já discutido anteriormente um ramo autônomo do direito sobre crimes comuns por meio da rede é inviável e carece de necessidade, uma vez que não há que se falar na inaplicabilidade do Código Penal, dessa forma, o Direito evoluiu, as leis tem caminhado ainda que vagarosamente em direção aos novos modelos de comunicação, no entanto, o que se pede e que se busca para afastar totalmente a impunidade para estes tipos de delitos é meios de investigações mais eficazes e efetivos, nas bastando que a lei preveja a criação de setores de investigação especifico se não houver por parte do Estado contribuição para alcançar o modelo legalmente idealizado.

Em suma, não há ausência de leis ou legislação específica capazes de se sobrepor a ausência de meios investigativos mais eficazes, uma vez que a presença de legislação específica sem meios eficazes para se chegar à autoria destes crimes, seria o mesmo que manter uma legislação inerte e inaplicável. Neste ponto, não basta apenas questionar a necessidade de legislação especifica, de modo que por muitas vezes, esta acaba sendo a grande prioridade quando, na verdade, o grande ponto fraco dos crimes praticados por meio da internet é a precariedade dos meios de investigação.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, não houve o propósito de se discutir os crimes propriamente informáticos, posto que nestes crimes teríamos que nos aprofundar necessariamente ás leis especificas que buscam regulamentar o espaço virtual, muito pelo contrário, o presente trabalho buscou abordar um único crime especificamente, quer seja, o crime de auxilio ao suicídio, previsto no art.122 do Código Penal.

A ideia central é a compreensão dos meios de promoção deste crime através da internet e de como ainda há ausência de conhecimento sobre a sua tipificação em nossa legislação penal. Além disso, o ponto de crítica não poderia ser outro, se não a vulnerabilidade das vítimas que seguem sem conhecer o universo cibernético. Ainda que seja um tema pouco disparado na média e nos veículos de comunicação e, isto encontra respaldo no fato de que muitas pessoas desconhecem inteiramente a existência de referido crime em nossa legislação penal, é importante que haja conscientização sobre as consequências de brincadeiras que, inicialmente, podem parecer inofensivas.

Acredito que quando este crime vem a ser praticado através da internet não há qualquer óbice á aplicação do Código Penal, isto porque, a internet, neste caso, funciona apenas como o meio para se chegar ao delito fim. Os criminosos, por sua vez, se utilizam deste meio porque possuem o conhecimento necessário sobre suas vítimas através de informações obtidas em redes sociais, o que facilita a ação e lhes garante maior êxito na pratica do crime.

No entanto, o grande problema enfrentado quando se fala em delitos na internet, esbarra não na questão de legislação especifica, mas sim na problemática da investigação em relação á autoria destes delitos, o que desde já aponto como uma segunda crítica ao tema abordado. O que vem se ausentando para sanar qualquer tipo de impunidade para estes crimes é um melhor investimento por parte do Estado em setores especializados, com melhor preparo, equipamentos, e treinamento da Policia Judiciária. Nota-se que boa parte deste problema veio a ser dissipado com o advento do Marco Civil que aproximou as autoridades dos responsáveis pela guarda e informação dos dados dos usuários na internet, quer seja, os provedores de acesso, porém não basta responsabilizar os provedores, uma vez que, os criminosos possuem conhecimentos sobre o funcionamento da rede aumentando os meios de garantir o sigilo e consequente impunidade.

Além disso, a inclusão digital tem se tornado uma realidade em nossa sociedade, o que é bom e idealiza mais um objetivo cumprido em favor da nossa sociedade, porém a inclusão, por si só, não basta é necessário que ela venha acompanhada de orientações e ensinos sobre os novos meios de comunicação, posto que qualquer indivíduo leigo será a presa ideal para os criminosos virtuais. Desta forma, uma segunda solução para o combate aos crimes praticados através da internet é inclusão digital amparada por maiores informações e orientações aos usuários, evitando que estes usuários acabem, por ausência de conhecimento, contribuindo para a consumação dos diversos crimes praticados na rede.

Se conhecimento é poder, é isto que tem faltado para os internautas e, não no sentido de conhecimento acadêmico, mas sim de como utilizar a internet com segurança e precaução, a fim de evitar percalços inerentes a uma sociedade. Independente de onde estejamos, das tecnologias que usamos ou de como estamos nos relacionando o crime é parte da mente e do anseio humano desde os primórdio, então é importante que se saiba não de onde virá ou como virá o ataque, mas como estar preparado a ele.

O presente trabalho, buscou agregar a ideia da vulnerabilidade dos usuários da internet em relação ao crime de auxilio ao suicídio e de como o direito tem se aproximado destas questões. Sabe-se que ainda há muito para se aprimorar, uma vez que para a ciência do direito a internet ainda é uma atualização recente, dessa forma, temos que os conflitos relativos a este novo meio de comunicação tem sido solucionados muito mais por meio de decisões repetitivas dos tribunais do que pela própria legislação.

É importante destacar que a dura crítica quando se trata de internet e a pratica de crimes é a ausência de legislação específica, no entanto, durante minha pesquisa e na elaboração deste trabalho, posso me posicionar no sentido de que a ideia da necessidade de criação de um ramo autônomo do Direito é prematura, uma vez que não basta criar diversas leis regulamentando um mesmo assunto, devendo ser estabelecido meios mais eficazes para a investigação, posto que regulamentação sem a atuação do judiciários seria irrelevante. O que deve ser buscado para a solução do problema aqui apresentado é menos leis especificas e mais meios para que as autoridades as façam cumprir.

É importante trazer a baila que os a aproximação do direito á internet garante segurança jurídica em um novo espaço e proporciona aos operadores do direito maiores respostas frente ao conflitos que estão apenas começando sobre este novo meio de comunicação social. O ponto critico da elaboração do trabalho é ausência de discussão e conteúdos sobre o referido tema, posto que as doutrinas em sua maioria estão se aproximado mais da questão do direito como ser digital.

Não obstante, o referido trabalho não possui escopo finalístico de solução aos problemas aqui tratados, uma vez que ainda haverá muito que se inovar e discutir sobre referido tema, na medida em que não existem precedentes para o avanço da tecnologia que hoje vivemos, por tal motivo, o trabalho buscou detalhar questões que no presente momento precisa de maior atenção no universo jurídico e demonstrar que até aqui o direito já deu um grande passo. O que antes era um universo distante do olhar jurídico, hoje passa a ser um tema de grande importância a ser apreciado por nossos tribunais.

O trabalho aqui apresentado possui o escopo de informatizar e buscar um melhor debate sobre o tema do crime de auxilio ao suicídio e para rechaçar a ideia equivoca de que há ausência de legislação especifica no combate a este crime, uma vez em que, como visto, o nosso Código Penal é amplamente aplicado ao caso concreto, ainda que praticado pela internet. Por mais que ainda seja um assunto novo com muito a ser aprimorado juridicamente, é importante chamar a atenção de advogados, juízes, promotores, acadêmicos de direito, juristas e doutrinadores. Este ramo do direito precisa crescer, precisa de maior amplitude a fim de que se evidente que não é uma questão esquecida, que existe legislação e aplicação de punição para aqueles que lesionar ou ameaçar lesionar direito de terceiro.

7. BIBLIOGRAFIA

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1 SUMARES, Gustavo. Criador da internet, Tim Berners-Lee diz estar 'preocupado' com o futuro dela. 16/11/2017. Acesso em: 12/12/2017. Disponível em: <https://olhardigital.com.br/noticia/criador-da-internet-tim-berners-lee-diz-estar-preocupado-com-o-futuro-dela/72385>.

2 SILVA, Rita de Cássia Lopes da. Direito Penal e Sistema Informático. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 4 v. p.22. Ibidem, p.24.

3 CASTELLS, Manuel. A galáxia da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. Ibidem, p.15, p.7.

4 __. Bill Gates: “Não há vida fora da Internet”. 2008. Acesso em: 12/12/2008. Disponível em: <https://tigredefogo.wordpress.com/2008/04/09/bill-gates-nao-ha-vida-fora-da-internet/>.

5 BETIOLI, Antônio Bento. Introdução ao Direito. São Paulo: Hermes, 1989. Ibidem, p.17, p.19.

6 No pensamento de Hobbes o homem é o maior inimigo do próprio homem, ou seja, capaz de gerar males sobre si mesmo e para os demais em decorrência de sua natureza. __. O que significa a frase O homem é o lobo do homem. 2011. Acesso em: 11/05/2018. Disponível em: <https://www.significados.com.br/o-homem-e-o-lobo-do-homem/>.

7 __. Heráclito de Efeso. 2005. Acesso em: 12/12/2017. Disponível em: <https://www.pensador.com/autor/heraclito_de_efeso>.

8 JESUS, Damásio de; MILAGRES, José Antonio. Manual de crimes informáticos. São Paulo: Saraiva, 2016.

9 PINHEIRO, Patrícia Peck. Direito Digital. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

10 CHATFIELD, Tom. Como viver na era digital. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012. Ibidem, pag.5.

11 VALLE, Regina Ribeiro do et al. E-dicas: O direito na sociedade da informação. São Paulo: Usina do Livro, 2005.

12 CHATFIELD, op. Cit.

13 INELLAS, Gabriel Cesar Zaccaria de. Crimes na internet. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004. p. VII.

14 JESUS, MILAGRE, op.

15 COSTA, Ana Maria Nicolaci da. Na malha da rede: Os impactos íntimos da internet. Rio de Janeiro: Campus, 1998.

16 INELLAS, op. cit.

17 Ciberespaço: novo ambiente humano e tecnológico de expressão, de informação e transações econômicas. (RIBEIRO, Regina do Valle. E-dicas, Usina do Livro, 2005, p.17).

18 __. Sinonimos. 2005. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <https://www.sinonimos.com.br/vulneravel/>.

19 Jus puniendi: é o direito que possui o estado de punir aquele que praticar qualquer fato descrito e tipificado como crime. __. Dicionário Informal. 2006. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <http://www.dicionarioinformal.com.br/ius+puniendi/>.

20 SILVA, op. cit.

21 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p.17. Ibidem, p.20. p.132.

22 VELLE, op. cit, p.165.

23 Modus operandi: expressão em Latim que significa “modo de operação”, tal expressão se refere á maneira como um indivíduo se utiliza para trabalhar ou agir. __. Significados. 2006. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <https://www.significados.com.br/modus-operandi/>.

24 __. _ Convenção Interamericana de Direitos Humanos. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao americana.htm>.

25 __. Decreto nº592, de 6 de julho de 1992. 2002. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm>.

26 Vedação ao retrocesso: visa proteger ao máximo os direitos fundamentais vedando que sejam suprimidos ou entrem em estado de retroação.

27 A palavra cliquet é de origem francesa e utilizada pelos alpinistas significando que a partir de um determinado ponto da escalada, não é possível retroceder. __. JUNIOR, Dirley da Cunha. A proibição do retrocesso e o efeito “cliquet” dos Direitos Fundamentais. 2016. Acesso em: 17/12/2017. Disponível em: <https://dirleydacunhajunior.jusbrasil.com.br/artigos/152845012/a-proibicao-do-retrocesso-e-o-efeito-cliquet-dos-direitos-fundamentais>.

28 LENZA, Pedro. Direito constitucional. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 1040.

29 MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Contitucional. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 255. Ibidem, p. 256.

30 DURKHEIM, Émile. O suicidio. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

31 __. Falando abertamente sobre suicídio. Acesso em: 20/12/2017. Disponível em: <https://www.cvv.org.br/wp-content/uploads/2017/05/falando_abertamente_sobre_suicidio.pdf>.

32 BERSHIDSKY, Leonid. Como a Rússia deu origem à Baleia Azul, jogo de suicídio que preocupa o Brasil. 26/04/2017. Acesso em: 20/12/2017. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/ideias/como-a-russia-deu-origem-a-baleia-azul-jogo-de-suicidio-que preocupa-o-brasil-944jc99a8hw9d37fosnfhjac4>.

33 SILVA, Claudia Carvalho. O que é, afinal, o jogo suicidário Baleia Azul? 28/04/2017. Acesso em: 20/12/2017. Disponível em: <https://www.publico.pt/2017/04/28/sociedade/perguntaserespostas/perguntas--respostas-sobre-o-jogo-suicidario-baleia-azul-1770413>.

34 SILVA, Claudia Carvalho. 28/04/2017. Acesso em: 20/12/2017. Disponível em: <https://www.publico.pt/2017/04/28/sociedade/perguntaserespostas/perguntas--respostas-sobre-o-jogosuicidario-baleia-azul-1770413>.

35 GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Dos crimes contra a pessoa. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 8 v. p. 44. Ibidem, p. 45. P. 46

36 __. Princípio Da Alteridade. Acesso em: 20/12/2017. Disponível em: <http://www.blogladodireito.com.br/2016/06/principio-da-alteridade.html#.WpMmBR0bPIU>.

37 JESUS, op. cit, p.56, p.57.

38 GOUVEA, Sandra. O direito na era digital. Rio de Janeiro: Mauad, 1997. p.59.

39 JESUS, op.cit, p.57.

40 PARKER, Rj; SLATE, Jj. Social Killers: Amigos virtuais, assassinos reais.com. Rio de Janeiro: Darkside, 2015. p.239.

41 INELLAS, op. cit, p.78, p.84.

42 INELLAS, op. cit, p.73.

43 JESUS, Damásio de; MILAGRES, José Antonio. Manual de crimes informáticos. São Paulo: Saraiva, 2016. p.169. Ibidem, p.170, p.175.


Publicado por: Aline Pereira de Souza

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